terça-feira, 12 de maio de 2009




Esta é uma história inspirada na experiência do meu avô materno, João Ramalhinho, que foi para a Guerra do Ultramar, para uma localidade chamada Binta, na Guiné.
“Parti do Cais da Rocha Conde de Óbidos, a 5 de Maio de 1964, no paquete Uíje, com destino à província da Guiné. Neste barco iam cerca de 4 mil homens. Os almoços eram servidos a partir das 10:30 da manhã até todos almoçarem. Os primeiros a comer, por vezes, infiltravam-se noutras companhias para almoçarem outra vez, tirando o crachá da sua companhia. Dia 13 de Maio do mesmo ano, cheguei a Bissau, onde houve a respectiva formatura para ouvirmos o Comandante-Chefe das Forças Armadas, Sr. Arnaldo Shurt. De seguida, as companhias foram distribuídas para as suas zonas de combate e a minha foi para o norte da Guiné, para uma localidade chamada Binta, a escassos 30 Km da fronteira do Senegal.
Binta era banhada pelo rio Cacheu, o qual serviu para nós lá chegarmos, num cargueiro chamado Carvalho Araújo. Depois de chegarmos a Binta, chegou a hora dos problemas. Esta localidade nunca tivera tropas portuguesas.
Os primeiros meses foram passados em abrigos construídos pela minha companhia, pois não havia habitações dignas e éramos atacados constantemente.
Na margem esquerda do rio Cacheu, situava-se uma das piores zonas da Guiné. Quando o nosso inimigo se apercebeu da nossa chegada, atacou-nos para ver a nossa reacção. A minha companhia respondeu fortemente, para os intimidar. Já em 1965, o nosso inimigo tinha melhores armas do que nós, mas não tinha cabeça. O que mudou radicalmente, pois o inimigo começou a receber ajudas de outros países.
A nossa companhia era abastecida por um barco que atracava em Farim, a 18 Km de Binta. Para nos deslocarmos a buscar os mantimentos, tínhamos de andar 2 noites e 1 dia a limpar as estradas e éramos atacados. Recebíamos o correio por via área. O nosso dia-a-dia era passado no mato, onde fazíamos emboscadas e onde também éramos atacados por turras. Na zona, havia muitas pontes que eram destruídas para não passarmos, mas nós levávamos 2 vigas de ferro da largura dos pneus e só assim conseguíamos passar.
No ano de 1966, já tínhamos muitas baixas e o capitão instalou um pelotão em Guidage, que fazia fronteira com o Senegal. Eu também fui contemplado para ir. Aí éramos atacados todas as noites.
E foram assim os 24 meses passados nestas províncias ultramarinas. Cheguei a Portugal a 14 de Maio de 1966.”

Ana Rafaela